A experiência da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) na gestão e implementação de políticas de acesso à água para famílias agricultoras desta região será apresentada como boa prática no seminário Mudança Climática e Pobreza promovido pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). O evento será na sede da entidade em Roma, na Itália, no dia 19 deste mês.
O seminário é uma das etapas que antecedem a finalização da 1ª Estratégia e Plano de Ação para as Alterações Climáticas da FAO. O Plano vai orientar os esforços do organismo para impulsionar os países no cumprimento de três Objetivos de Desenvolvimento Sustentável voltados para o fim da pobreza, da fome e mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas. Segundo a organização da ONU, as respostas políticas atuais produzirão resultados mistos e, em alguns casos, prejudiciais para as pessoas pobres e marginalizadas.
Ao convidar a ASA para apresentar sua experiência de democratização de água, a FAO demonstra interesse em conhecer as soluções construídas pelas organizações da sociedade civil que formam a Articulação brasileira. Além da experiência da ASA, também será apresentada a iniciativa Plataforma Semiárido na América Latina pelos representantes da Articulação Rede Chaco e da Plataforma Semiáridos Argentina.
“O seminário possibilita que a nossa experiência seja partilhada no sentido de fortalecer as relações Sul-Sul e também vai proporcionar trocas e aprendizados com outros países e experiências. Além disso, também será uma oportunidade de reforçar as parcerias internacionais da ASA”, assegura Valquíria Lima, da coordenação executiva da ASA Brasil pelo estado de Minas Gerais, que participará como debatedora do painel “Perspectivas e parcerias para a criação de uma Plataforma Semiárida na América Latina” no seminário em Roma.
No Semiárido brasileiro, vivem 11,8% da população nacional, entre os quais se encontram ¼ dos/as brasileiros/as em situação de miséria. Apesar dos graves problemas sociais acentuados pelas estiagens e por políticas públicas inadequadas de combate à seca, o Semiárido também é uma região com potencial enorme de produção de alimentos uma vez que abriga 1/3 das famílias agricultoras de todo o país. No entanto, segundo a FAO, é justamente essa população rural, dependente da agricultura e meios de subsistência rurais para sua renda e segurança alimentar, a primeira afetada pelas mudanças climáticas.
Segundo Antônio Barbosa, coordenador dos programas Uma Terra e Duas Águas e Sementes do Semiárido, que faz parte da comitiva da ASA que vai à Roma, a apresentação da Articulação no seminário da FAO mostrará os resultados alcançados pelos quatro programas da Articulação e também vai abordar elementos que são fundamentais para que a intervenção provoque mudanças reais na vidas das famílias camponesas.
“A nossa grande fonte de inspiração é o conhecimento das próprias famílias que vivem na região há séculos, convivendo com a irregularidade das chuvas. O que a ASA faz é sistematizar esse conhecimento local para propor políticas públicas adequadas e capazes de promover a convivência da população com o Semiárido. Também não podemos esquecer que tudo isto só é possível devido à parceria entre Estado e sociedade civil organizada”, atesta Barbosa.
Resultados da ASA – Entre os resultados levados para Roma, destaca-se o acesso à água para consumo humano para 2,4 milhões de pessoas e a estruturação de 98,4 mil propriedades com tecnologias que guardam água da chuva para produção de alimentos. As famílias que passam a gerir a água acumulada nestas tecnologias também participam de cursos, eventos e intercâmbios para a construção de conhecimentos.
Além das ações de ampliação do estoque de água para as famílias, a ASA também desenvolve o Programa Cisternas nas Escolas para prover o abastecimento das instituições de ensino no campo. O quarto programa da ASA fortalece a prática que as famílias agricultoras possuem de guardar sementes crioulas para o próximo plantio. Esse fortalecimento acontece através da reforma ou construção de bancos de sementes para uso comunitário. Assim, além das sementes estocadas em casa, as famílias dispõem de um reserva extra no banco comunitário. Até o momento, a ASA possibilitou que 640 comunidades rurais tenham um lugar, que representa um segundo nível de segurança para esse material genético, para guardar as sementes crioulas que fazem parte da sua cultura alimentar e produtiva há várias gerações.
Mas a demanda por água ainda é grande no Semiárido do Brasil: estima-se que mais de um milhão de famílias precisem de tecnologias que estocam água da chuva para seus plantios e para matar a sede dos animais que criam. E cerca de 350 mil famílias ainda estão sem as cisternas que guardam água para beber, cozinhar e escovar os dentes.
“Consideramos que, no momento político atual de perda de direitos e diminuição de investimentos públicos nos programas sociais, precisamos reforçar a necessidade da continuidade das Políticas Públicas que fortalecem a Convivência com o Semiárido, uma proposta que vêm contribuindo efetivamente para a redução da fome e da miséria na região”, reforça Valquíria.
Missão na Europa – Após a participação no Seminário, a comitiva da ASA vai aproveitar a estada na Europa para prospectar novos parceiros internacionais para que as ações de convivência com o Semiárido não parem. Atualmente, mais de 90% das ações desenvolvidas pela ASA provém de investimentos públicos, via Governo Federal. No entanto, desde o ano passado, os recursos destinados às ações propostas pela ASA foram muito reduzidos.
A delegação da ASA participará de reuniões com ONGs, Agências de Cooperação Internacional e parlamentares de seis países europeus – Itália, Alemanha, Suíça, Áustria, Espanha e França – até o dia 9 de maio.
Texto – Verônica Pragana/ASACOM Imagem – Ana Lira/ASACOM